textos de própria autoria, de própria vida. minha vida, sua vida, nossa vida.



quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

ano novo. década nova.

Para uma boa passagem de ano. Que venha uma nova década!
Aos meus amigos e familiares, que estejamos unidos por mais uma década.

Intuo muita luz e força para todos!

Abraços calorosos!!!

terça-feira, 29 de dezembro de 2009

vertigem.

nunca gostou de sentir aquela sensação. parece que o chão lhe faltava, que o corpo cairia sem eira ou beira, que a cabeça giraria feito roda gigante em parque de diversão. seu corpo não tremia, mas parecia que iria ceder como um prédio em demolição. seus olhos lhe enganavam sobre aquilo que via e seus sentidos agiam conforme posição de defesa. queria seguir adiante, mas algo lhe impedia de dar o próximo passo ou virar-se para o lado. estava estática, sem movimento que lhe tirasse daquele lugar. esperava por alguém conhecido para lhe salvar daquela sensação, mas todos passavam despercebido e se faziam cegos sobre seu mal estar.


nova onda de tontura. senta no chão. leva a mão à cabeça. tem um leve desmaio em meio à multidão que não lhe vê.

-> foto by Sam.

segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

olhos abertos.

acordara. mas percebera que ainda nem dormira. eram 4h e seus olhos permaneciam sem qualquer movimento de leveza. eram 4h e não havia ninguém que pudesse lhe fazer companhia naquela madrugada. pensou em seus remédios e lembrara que um amigo, em ataque de preocupação, resolveu tirar a cartela que carregava na mochila e jogara no lixo. amitriptilina, diazepan, novalgina, dipirona, nada para lhe dar uma boa noite de sono. pensou também na c. indica, mas era tarde da noite para sair na rua a fim de usufruir desse relaxante. sua caixinha de cigarro estava vazia e não haveria lugar para comprar aquela hora. ligou a televisão e não havia um filme que lhe chamasse atenção. e nem podia ficar fazendo barulho àquela hora. não morava sozinha e se acordasse alguém, sabia que resmungariam sobre sua insônia. e quem poderia compreendê-la se, mesmo ela, não entendia o que acontecia com seu corpo nessas noites onde o sono lhe fugia, por mais que o cansaço fosse latente. parece que a cabeça girava à mil por hora e não conseguia desvincular os pensamentos que gritavam por atenção. "cá estou. me solucione!". o que tanto sua cabeça batutava que não a deixava dormir? nem podia se lembrar! se lembrasse, mataria o que lhe causava essas noites mal dormidas. nem o livro do Kundera que estava lendo naquele dia lhe trazia sonolência. indagava sobre um deus e perguntava sobre a presença de qualquer entidade para conversar. porque se sentia tão só durante a madrugada? pensou nos homens que procuravam as garotas da noite. talvez, nem fosse pelo sexo em si mas, quem sabe, para ter companhia durante algumas horas de uma noite mal dormida. o que o sexo, em si, poderia proporcionar? fora o cansaço físico, o fato de orgasmar não lhe indicava sono. parecia que mais lhe despertava e lhe deixava o gosto de querência por aquele sentimento. como pegar no sono?

eram 6h30 quando seus olhos piscaram.

às 7h30 quando acordou para trabalhar ao som do despertador.

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

para mais um natal.

Para você que pagou os impostos, não atrasou um dia só seu carnê das Casas Bahia, pagou o dízimo da sua Igreja, a escola dos seus filhos, o aluguel da casa, o IPVA do carro e o seguro, fez sua inscrição na Nota Fiscal Paulista, colocou crédito ainda esse mês no bilhete único por conta do aumento do próximo ano. Você que obedeceu as leis e ainda levou alguma multa, quero lhe desejar um feliz natal! Que seu pernil não tenha sido tão caro e que ninguém vomite no seu tapete! Que as crianças não quebrem a árvore de natal antes da meia noite e que sua avó não fique recolhendo os papéis de embrulho para reaproveitar!
Que a noite de Natal seja comemorada com as pessoas que mais lhe importam e que, nessa noite, você possa esquecer quem é e, se der sorte, voltar para casa sem sua peça íntima!
Boa noite de comilança!
Atenciosamente.

Samira Nagib.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

desalento.

quero falar sobre as estrelas para alguém que não conheço. quero ter sentimentalidades e até amor ou reações afetivas sem mazelas, sem casos ou descasos. quero escrever poemas melosos, daqueles que os maiores poetas falaram de amor. quero sentir paixão e amor ao mesmo tempo mas, acima de tudo, que fosse algo que durasse, sem mágoas ou empecilhos que causassem desgaste. quero sentir o frio na barriga e o gosto de um beijo novo por alguém que deixe sua marca em meus beijos, sem que haja desejo pelo beijo de outra pessoa. quero partilhar do que é meu, mas sem que se torne só eu. quero conhecer o que é do outro e poder desfrutar desses dois mundos.
quero prosear sobre sensibilidades, sobre romanceios, sobre chacótas ou balelas que causem interesse e não só inúteis palavras. quero sentir que o amor é para todos porque ele é belo e não deve ser temido. mas quero ter o que sinto e só disso, sustentar um ínfimo de coisas passadas, presentes e futuras.
quero falar do que é essencial para meu ser, mas ouvir e ter prazer em ouvir o que é do outro. quero gozar das alegrias e das tristezas sem temer por julgamentos ou lacunas espaciais entre os dois corpos e os dois pensamentos.
quero ter força para tentar de novo. e, se não for viável, que venham as próximas.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

mesa do bar - parte 2.

- achei que você não havia reparado na minha presença.

era uma paixão nova, daquelas que lhe tira o folego só de sentir ou pensar. não sabia o quanto duraria e, de certa forma, sabia como suas sentimentalidades fugazes lidavam com isso. e, ao mesmo tempo, adorava aquela epifania de espera por qualquer sinal de agrado. já lhe era tão passado essa sensação que mal se reconhecia agora, no mesmo sentido que lhe causava certa ânsia aquele toque de momentaneidade.
dizem que paixões duram o tempo de uma estação climática. se passar disso, é amor. mas o amor não lhe deixava lá contente. trazia algo morno, parado e sem tempero. paixão sim, tem todo aquele gosto de coisa nova. misto de sedução com gestos acalorados. quando as pernas bambeiam e o coração entra em disritmia e a vontade de o tempo parar para todos e seguir em lentidão para a outra pessoa e você é o que mais almeja.
quando o beijo é dado entre o canto da boca e a vontade de, discretamente, escorregar os lábios para que um beijo aconteça. quem sabe depois desse outro, outro, outros... mordia os lábios toda vez que pensava nisso e já não sabia se pensava em outra cousa senão nos lábios, no sorriso, no jeito que o cabelo mexia com o dançar do corpo, com os simbolismos que eram deixados à vista para que não houvesse duvida.
sentia um arrepio pelo corpo que lhe causava moleza quando cruzava os olhos despercebidos. no sentido que queria, poderia olhar para aqueles olhos que pareciam tão profundos que poderia buscar em seus círculos inspirações para escrever sobre o tempo e o vento, sobre amores e dores, sobre música e poesia, sobre a vida e tudo o que aqueles olhos escondiam por trás de uma pequena vidraça emoldurada em acrílico.
o que aqueles olhos poderiam lhe mostrar? o que aqueles lábios queriam lhe provar (ou tentar)? o que aquele corpo lhe chamaria para dançar?

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

mesa do bar.

estava ali, sentada na mesa do bar, com um copo de cerveja na mão que deixava marcas na mesa. estava sozinha, como se esperasse alguém ou se esperasse eu me aproximar para puxar papo. vestia uma camiseta com um desenho bobo, uma calça jeans e tênis. parecia não ser daquelas redondezas, mas sempre a via por ali.
fazia careta toda vez que bebia do conteúdo do copo. puxava o cabelo para trás. respirava fundo e tomava mais um gole. poderia ficar fazendo aqueles movimentos por diversas vezes. e eu poderia ficar ali, apreciando aqueles movimentos que faziam minha boca secar toda vez que o copo aproximava da boca.
ela olhava para os cantos, para o relógio. os badulaques no pescoço balançavam segundo a dança que seu corpo fazia quando se mexia. ela sacodia o pé impaciente. puxava os fios do cabelo teimoso que insistiam em esconder seus olhos. e sorria para o fundo do copo para olhar os dentes.
ela pede outra garrafa. ela faz outro brinde. ela beija o copo. minha boca seca. caminho sentido sua mesa. ela levanta os olhos. ela sorri. eu sorriu. ela diz:

- achei que você nunca viria.

sábado, 28 de novembro de 2009

boca.

estive lembrando de sua boca.
o formato único que delineava a carne de seus lábios.
ou que riscava seu sorriso.
o jeito que essas linhas salientes de seu rosto simulavam palavras
que mal me chegavam ao ouvido.
era hipnotizada por aquelas linhas rosadas,
que abriam espaço para língua, dentes e céu.
o céu de sua boca em que quis chegar.
que cheguei.
que parti.
que partiu de minhas linhas salientes.
que te procuraram em outras linhas.
em outros rostos.
que nunca achei.
que nunca foi achado.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

a solidão dos indivíduos.

labirintos cinza e amarelos, forrado por um piso frio e avermelhado. os sons existentes são os insetos que cantam a noite, ou dos gatos que surgem com o vento e somem como poeira. mas com pouco sinal de vida humana para atrapalhar.
um homem gira sua cadeira de rodas sentido lugar algum e some na escuridão. outro homem senta à varanda do prédio contemplando o ínfimo jardim existente à seu horizonte, como se esperasse alguém vir buscá-lo.
o silencio toma forma, sendo quebrado vez ou outra, conforme os pés descobrem aquele terreno, por um molho de chaves ou risadas de vestimentas brancas. o prédio de janelas semi-serradas dá visão para uma árvore de natal previamente montada.
ouvem-se cochichos. ouve-se alguém sugar o catarro do pulmão e escarrar na comadre. ouve-se o rádio ligado em sintonia com músicas de décadas atrás, em janelas escuras. ouve-se uma mulher que não pára de gritar.
vê-se a luz de poucos aparelhos televisores ainda ligados que espanta a solidão daqueles que estão confinados em pequenos cubículos simples, dando cada um seu toque pessoal.
há uma rachadura na parede. há uma torneira seca com sinais de infiltração na base. há redes no segundo andar, barrando qualquer tentativa de atravessar para o lado que não há chão firme, somente ar. há árvores, flores e jardins simples, simbolizando um local sereno. há um muro de quatro cantos que isola os moribundos do mundo social. há o perigo de ser visto. há o perigo de estar sozinho. há a sensação de morte que ronda aquelas vidas, acalentando o desejo de finalizar seus dias.
há a solidão de um indivíduo por trás da janela de cortinas brancas, iluminado apenas pela luz de sua caixa de imagens, que vê sua amada sem poder beijá-la, apenar tocar-lhe as mãos entre as grades.
há uma janela que separa dois seres.

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

ditos para minha irmã.

tantos dias sem ver-te, que a lembrança de seu rosto quase se torna rascunho na memória. os traços delicados de seus contornos são acentuados com as fotos de sua meninice que estão no mural de fotos de nossa casa.
sempre que pergunto-me quando iremos lhe ver, lembro da alegria que emana em sua voz ao contar de sua nova vida, em uma nova terra. mas tão longe de casa...
surpreendo nossa mãe, vez por outra, refletindo sobre sua imagem na fotografia. seus olhos transbordam águas e se transforma em profundo. penso que ela deve caminhar em sua memória com pensamentos sobre você.
antes, muito antes de sua viagem, éramos irmãs que pouco se conheciam. minha imagem de ti sempre fora da irmã mais velha e nunca de uma possivel amiga. meses antes de sua partida, lembro de pensar sobre a distância que estaria entre nós, suas bases, e você, em seus novos horizontes.
quantos dias já se passou desde que lhe dei o último abraço! ainda sinto o cheiro de seus cabelos. ainda posso ouvir sua risada escandalosa e sua presença que intimava atenção.
em algum momento, eu quis ser você. era a menina doce que todos amavam. isso me impressionava e fazia te admirar, timidamente, em silêncio.
crescemos em uma mesma casa e seguimos para lugares deveras diferentes. mudamos com o tempo, adquirimos novos feitos. mas nunca te disse sobre meu amor por ti.
sinto falta de suas críticas sobre o que eu vestia, ou quando você pedia opinião sobre o que comprava. lembro e acabo repetindo, mesmo que inconscientemente, as palavras que você tanto repetia ou o jeito que você as dizia.
com sua partida, a casa perdeu um pouco do jeito escalafobetico que você trazia. há menos ligações no telefone. há menos caixas de sapatos pela casa. há um pouco menos de Maria Callas tocando. há menos de Mark Darcy passando. e, quando passa, logo nos lembramos de ti. os movéis mudaram um pouco de lugar. ganhou um pouco de meu gosto, que antes era o teu que predominava.
dias depois de sua partida, percebi o papel que a filha mais velha na casa tem. são mais responsabilidades e cobranças nossas mesmo. é algo mais sério, com um toque de maturidade.

você se foi e nós ficamos.
ainda há e sempre terá muito de ti em nós.

com muito amor e saudades.

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

aniversário.


data de aniversário é algo pra lá de engraçado.

você liga desejando feliz aniversário, como se a pessoa já não tivesse ouvido aquilo diversas outras vezes durante aquele dia.

até os 11 anos, você deseja a maior festa, com todos seus amigos e com muita bexiga. e, lógico, diversos presentes. as tias vão em casa, apertam suas bochechas e dão de presente pijamas e meias. dos 12 à 14 anos, é a fase do pré-adolescente, onde o palhaço para animar a festa já não é mais bem quisto. a garotada quer dançar sem os pais por perto, com o rostinho colado, com a paixão de sua vida. dos 15 aos 17 não tem tanta graça. as festas são mais reuniões com os amigos. o reconhecimento que você ganha é o de votar. o que é esperado mesmo é a festa de 18 anos, porque acredita-se que pode-se fazer tudo com 18 anos, inclusive tomar cerveja na festa de aniversário. mas, quando passa a data, cadê aquela expectativa da maioridade? os anos seguintes vão passando... arranja-se um emprego, namoros, mais estudos, carros, outros tipos de festas... o dinheiro vai faltando, o tempo tá passando! quando completa-se 21, alguém sempre diz: "agora sim, você é maior de idade e responsável por si". mas, a maior-idade é com 18 ou 21 anos?
o tempo continua passando... completa-se 25 anos. e, segundo dizem, é a fase que parece acelerar no relógio do tempo. passa-se tudo muito depressa, como quando você corria da da escola para assistir seu desenho na televisão. lembra? talvez não. com o passar do tempo, vamos esquecendo do início de nossas vidas.
a partir dos 30 já nem se fala quantos anos tem. no bolo existe uma única vela (para não constranger). mas o tempo continua passando. Os anos vão continuar roubando as folhinhas do calendário da sala. e não há nada para fazer-se.

até há...

fica ao seu gosto como vai fazer para o tempo não passar tão depressa. E tão sem graça.

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

manhã preguiçosa.

acordou atrasada, como todos os dias desse último mês. aliás sua elegância com pontualidade estava deixando a desejar e, ela mesma, não sabia por quê. talvez, porque estivesse cansada de tudo, todos, do mesmo de sempre. quando o relógio despertava de manhã, ela olhava para a tecla de desativar e pedia mais uma hora de sono.

levantou-se da cama e caminhou para o banheiro, onde a água quente certamente a faria acordar aos poucos. abriu os olhos lentamente, sentindo a sensação de cada gota de água que acarinhava seu corpo.

desligou o chuveiro. apanhou a toalha de algodão. secou o corpo. caminhou nua pelo apartamento. ligou o rádio. foi até a cozinha e colocou água para o café no fogo. o celular tocou. caminhou até o meu da sala e viu, pelo visor do aparelho, que era seu chefe. resolveu não atender. voltou para a cozinha. tomou o café e comeu seus biscoitos de chocolate.

voltou para o quarto. abriu uma gaveta. vestiu uma calcinha e um sutiã. no armário, pegou um jeans, uma camisa e um tênis. penteou o cabelo em coque. Sempre achou que era mais charmoso do que qualquer outra coisa.

Pegou sua bolsa. conferiu o que tinha dentro. agenda, canetas, carteira, nécessaire, livro, papel, jaqueta, remédios, caixa de cigarro. tudo certo.
apanhou a chave que estava sobre a mesa.olhou ao redor para conferir se nada estava fora de sua ordem. abriu a porta. abaixou a cabeça. pensou: “odeio ter de trabalhar”. fechou a porta com chaves. saiu para mais um dia que demoraria para passar.

terça-feira, 20 de outubro de 2009

palavras entaladas.

as palavras ficaram presas, de forma sufocante, na garganta que antes era caminho de uma ânsia por seus beijos. você se foi e só pude dizer “vai com luz nessa caminhada. espero que seja feliz independente de quem esteja ao seu lado”. o café esfriou. o tempo passou. tudo ficou sem cor.
você estava dizendo adeus pela segunda vez. e, pela segunda vez, fiquei com palavras não ditas em minha cabeça. tanta coisa poderia dizer, mas preferi ficar em silêncio, antes que as palavras torturassem minha alma quando fossem ditas para ti, em vão.
queria te dizer para tentarmos, talvez, algo novo, que pudesse dar certo entre nós. algo que fizesse você querer ficar comigo. algo que eu pudesse fazer estando contigo. mas, perto de ti, prendia todo o meu desejo de fazer e ser. acabei me tornando um objeto quase inanimado ao seu lado. você era o que iluminava meu cantinho escuro. com você, eu não precisava de mais nada. eu não queria mais nada. você era o que eu achava que me completava, mas mal me conhecia e mal pude me apresentar para ti.
eu te quis. eu tentei. eu te amei. eu sufoquei sua lembrança dentro do que chamei de amor puro que era para ti, mas fizestes jogo de cartas com os sentimentos que lhe enviava. para tanto, muito esforço não foi preciso. você olhou em meus olhos e, com um sorriso, disse que me queria e tentava me envolver em seus braços, para mais uma vez, insinuar seus desejos sob meu amor.
meu amor, meu amor, meu amor, minha dor.
nesse tempo em que passou, as palavras foram empregadas para outros fins. mudei caminhos, mudei amigos, mudei sentido. mudei o que achava que me lembrava você.
os moveis mudaram de lugar. os cd´s tocaram em outro lugar. as roupas foram dadas. o cabelo foi cortado. o hidratante de corpo foi trocado. tudo foi modificado, para não me lembrar tanto de sua pessoa ou a pessoa que fui ao seu lado.
queria ter lhe dito sobre o bem que me fez a mudança que provocou em minha pessoa, onde eu cresci e alcei novos vôos. queria te contar de tanta coisa que vi e vivi! por deus, como eu quis isso!

mas, hoje, sou inerte a qualquer coisa que venha de ti.

porque as coisas passam, por mais tempo que demore.

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

.conversa fiada.

ela entrou no metrô, sentou-se no banco e largou a mochila sobre o colo.
ele entrou no mesmo vagão, sentou-se no mesmo banco que ela e deixou a mochila pesada no chão. virou-se para ela e disse:
- oi.
espantada, ela responde:
- oi.
- dias estranhos esses, né?! que faz sol e chuva quase ao mesmo tempo. a gente nunca sabe o que irá acontecer no final do dia.
- é verdade.
- eu sai de casa esperando que hoje fizesse sol ou um calorzinho pelo menos. aquele tipo de calor que dá vontade de tirar a blusa de manga longa e deixar o vento bater no pescoço. mas parece que o tempo está brincando com a gente...
- eu sei. sai de casa e deixei toda a roupa lavada no varal. mas acho que a chuva vai molhar tudo de novo e terei de lavar...
- roupas brancas ou coloridas?
- roupas brancas.
- ah, então não tem tanto problema. o pior é roupa colorida molhada pingando toda hora. imagina isso?! seria um pinga pinga colorido... rs
- verdade. não havia pensado nisso.
- ...
- ...
- já pensou na possibilidade de se apaixonar por uma pessoa que você nunca viu na vida?
- hã?
- sim. nunca te passou pela cabeça que a sua alma gêmea, o grande amor da sua vida, o pai dos seus filhos pode pegar o mesmo caminho que você todo dia e, por questões bobas, você nunca saberá, porque não puxa papo com ele?
- nunca pensei. mas, o que você quer dizer com isso?
- as pessoas não conversam. e, pelo simples fato de conversar, não que haja algum interesse. esses dias reparei que, quando ando com meu cachorro na rua, as pessoas são mais simpáticas, sorriem mais e até puxam papo. mas só quando estou com meu cachorro. quando estou só, elas mal sabem que estou ali passando.
- triste isso. sentia algo assim no início da faculdade. ou eu me isolava dos outros ou era excluida por ser novata. mas, com o passar do tempo, fui me adaptando àquele ambiente e aquela pessoas. hoje estou bem.
- mas isso aconteceu na faculdade. e no dia-a-dia?
- eu me relaciono com meu fone de ouvido.
- está vendo onde quero chegar? as pessoas deixam de conversar com outras para ficar no seu mundo de fones de ouvidos... uma conversa pode mudar muita coisa!

plim plam, estação sé. desembarque pelo lado esquerdo do trem.

- tchau. um dia a gente se vê.
- vou esperar que sim.
ele desembarca do trem. uma senhora senta ao lado dela.
- tempinho estranho esse, né?!



segunda-feira, 5 de outubro de 2009

medo do mar.

já não sei se observo esse mar com mesmo ânimo de antes.
talvez, as ondas sinuosas de suas águas tenham deixado-me enjoada ou cansada de sentir o gosto salgado de seu líquido.
deveras vezes, tentei jogar meu corpo para banhar nessa imensidão. mas logo, via-me com medo e retornava para meu porto seguro de areias firmes. firmes enquanto as ondas não invadem esse espaço.
ando por meu chão certo com medo de arriscar.
o que o mar tem que envolve tanta gente?
duvido de sua limpidez e de sua graça quando brilha ao sol. parece que tenta seduzir olhos ingênuos enquanto molha os pés de outros com entusiasmo.
tenho medo do mar. tenho medo de me afogar. tenho medo de deixar-me seduzir e esquecer, para o infinito, de minha certeza seca.
existe um trauma enraizado sobre o mar.
em outrora, tendo-me seduzido, larguei meu corpo e bebi do seu líquido salgado que racha o lábio.
quase afoguei-me, quando fiquei cega e só era do mar. quase me perdi...
sem perceber, hoje, molho só as pontas dos pés, para não perder à vida no mar.

fico incerta sobre o momento certo de arriscar.

ps: para os que entendem as entrelinhas.

terça-feira, 29 de setembro de 2009

martinis e aspirinas.

acordou com a maior enxaqueca que poderia ter após uma noite em festa. não tinha ideia de quanto havia bebido, só lembrava que sempre estava com um copo na mão e dos risos que era estampado na face.

não era mais uma menina. era uma mulher que morava sozinha e, por si mesma, tinha de se lembrar constantemente de sua solidão e saudade de sua família.

os amores sempre lhes foram furtivos e passageiros. sua beleza inflava o ego dos homens e sua companhia era bem quista, mas ninguém conseguia mexer com seus sentimentos. eram apenas casos e ela fazia questão de não esquecer disto.
ganhava flores, jóias, jantares, viagens. tinha deitado-se com mais homens que poderia se lembrar. noites em companhia de homens jovens e homens velhos, solteiros e casados, estudantes e gente de poder. e não só com homens, mas com mulheres também. era a mulher que todos queriam. mas somente como amante.

levantou da cama. colocou seu penoar sobre o corpo nu. descalça, foi até o banheiro e abriu a torneira de água quente da banheira. olhou no espelho e viu seu reflexo: uma cara amassa, maquiagem borrada e cabelo despenteado, ainda com a prisilia de cabelo.

voltou ao quarto, ligou o toca-discos e colocou um vinil de jazz que comprou na última viagem para NY. entrou no banheiro e mergulhou o corpo na água quente, enquanto acendia um cigarro e cantarolava a música. "In my solitude, you haunt me. With dreadful ease, of days gone by." a espuma começava a cobrir toda a banheira, deixando seu corpo submerso. levantou as pernas para olhar a parte de seu corpo que mais gostava, seus pés, que despertavam desejo quando usava seus saltos altos. - "coisa de fetiche masculino. vai entender".

despertou com o som do telefone, mas preferiu não atender. levantou-se minutos depois, enxugando o corpo com a toalha de algodão que estava pendurada na maçaneta da porta. abriu a porta do armário do banheiro e pegou seu frasco de aspirinas e engoliu três comprimidos amarelos amargos.

andou pela casa só com a toalha no corpo. abriu a janela da sala e, pela varanda, viu que o sol já anunciava que o dia estava pela metade. foi para a cozinha, abriu a geladeira e pegou um pedaço da torta que a empregada havia deixado duas semanas atrás. no bar da sala, preparou um martini. sentou no sofá da sala. o telefone tocou e ela atendeu:

- alô?
- senhorita Norma?
- sim. quem é?
- sou eu, o Bob. você estava tão linda na festa ontem que não resisti e resolvi te ligar. tem planos para o jantar?
- obrigada Bob. não tenho planos mas, e sua mulher?
- minha mulher? ficará em casa com meus filhos enquanto estarei numa reunião, se é que você me entende.
- entendo. fico lisonjeada com o convite, mas terei de dizer não, por um motivo maior. desculpe.

desligou o telefone. tomou seu martini. acendeu um cigarro. deitou no sofá.
"ter perdido esse jantar, certamente, me fez perder um presente. mas, que seja. hoje quero um dia só". cochilou.

sobressaltou do sofá quando ouviu o tocar insistente da campanhia. sentiu uma pontada na cabeça e percebeu que sua enxaqueca não havia passado. caminhou até a porta. olhou pelo olho mágico e viu Bob à sua porta. "o que ele faz aqui? será que não entendeu?". abriu a porta.

- olá Bob. o que devo essa surpresa em minha casa?
- espero que seja boa. vim ver-te. desde ontem, não paro de pensar em seu sorriso, seu jeito, seu cheiro. certamente, não poderia deixar esse dia passar sem dizer um 'oi' para ti.
- agradeço por isso Bob, mas não estou muito disposta à papear hoje. estou com um enxaqueca terrível e preciso tomar uma aspirina para dormir.
- mas você está com um copo de martini nas mãos. está bebendo mesmo com dor de cabeça?
- confesso. martini com aspirini são os melhores remédios para enxaqueca. você me pegou nessa.

com o corpo já na sala, Bob tira uma caixinha de dentro do paletó.

- trouxe para ti. espero que goste.

Norma abre a caixa. há um colar com diamantes e um par de brincos para combinar. não ficou muito surpresa, já que havia ganho outros desses tipo. os homens não tinham muita imaginação quando se trata de presentear uma mulher. acham que diamantes serão o jeito que farão uma mulher ir para a cama com ele. mas, com toda a cara de atriz que tinha, tentou disfarçar.

- ah, que graça. muito obrigada mesmo.
- quando o vi hoje cedo, na vitrine de uma joalheria, sabia que deveria ser seu.
- oh, que amor. o que posso fazer para lhe recompensar?
- ...

Norma sabia o que ele queria. e era o que todos queriam dela.

nesse instante, seu penoar baixou pelo seu corpo e sentiu o arrepio de vento que entrava pela janela aberta da sala.

inconscientemente, agradeceu por estar levemente entorpecida pela mistura de martinis e aspirinas.

sábado, 19 de setembro de 2009

carta de um náufrago à sua amada.

Estou cá, boiando sem querer, em um mar que não tem fim.

Passei por dias de calmaria que nem o vento refrescava o calor intenso que ardia com dias de sol, sem nuvens para dar-me sombra ou sossego.
Ontem, um temporal veio e quase perdi meu barco. Já sem rumo, me segurei em suas bordas, para não perder a única coisa segura que me salva.

Estive pensando na ilha que eu deveria chegar. Mas, perdi minha bússola que me ajudava a localizar o eixo central e já não sei como adivinhar as horas através do sol. Estou assim, boiando em meu barco para lugar e para coisa alguma.
Em uma noite, tive a impressão de ouvir um navio e, quando olhei, era somente o mar que zombava de minha solidão.

Estou me alimentando de peixes crus que consigo pescar com a fita de cetim do seu cabelo, aquela que você me deu no dia em que parti. E tenho bebido de águas tão salgadas que me deixa com enjôos durante todo o dia. Acabo bebendo só no meio da tarde, para não morrer de sede.
Trago comigo, além do barco que me salva e a fita de cetim para pescar, um livro com algumas folhas em branco, na qual escrevo essa; duas fotos, uma de ti, minha amada e outra de minha terra. Ah, que saudade do chão firme, do barulho que faziam os automóveis e da sonoridade das pessoas; e também, uma caneta que já hesita sua tinta.

Não sei se lerás isso. Aliás, não sei porque escrevo isso. Não tenho uma garrafa para colocar a carta dentro, como nos filmes de cinema. Acho que escrevo para me deixar vivo ou manter minhas esperanças sãs.

Estive lembrando das noites em que passamos acordados, vendo o dia raiar ou fazendo amor.
Aqui, só, meu sexo se tornou um órfão abandonado. Não tenho vontade de nada. E,como teria, se nada tenho aqui! Somente sobre-vivo com a lembrança de sua pele, seus seios, seus pêlos e cheiros. Lembro de seus beijos, primeiro tímidos, depois eufóricos.
Penso em ti e dá-me tanta angústia imaginar que estás em terra firme, com um alguém que não sou eu. Quando penso nisso, dá-me vontade de render-me à morte e lançar meu corpo ao sol ou ao mar.

Já cantei para Iemanjá e ela não entoou seu canto para mim. Talvez, a pouca fé que tenho, me dê isso de troco.

Estou aqui, entregue as lembranças, ao mar, ao nada.

De um náufrago à sua amada.

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

carta de uma amiga.

ontem, recebi essa carta de uma amiga e gostaria de publicar aqui, já com prévia autorização dela. aliás, pessoa pela qual tenho grande estima e intuo muito luz! abs.

*
A Samira é uma menina que espalha livros e pensamentos.

Eu lembro da Samira num dia que procurava gentes na ESP para espalhar leitura...

Carregava livros nas mãos e a ideia no pensamento era esvaziar um carrinho de mercado cheio até a Praça da República.

A Samira é uma menina que espalha bons pensamentos e bons sentimentos,

Arruma-se e se colore e ainda por cima diz que enxerga cores nas gentes.

Que cor será que ela vê em mim?

Multicor...?

A Samira é uma menina que espalha livros e pensamentos...

Com carinho, da amiga que te admira muito...


Giovana
11/09/09

terça-feira, 15 de setembro de 2009

Somos todos veados.

Por Fernando Bonassi.

Somos todos esses veados acuados por partidos, pela Igreja e pelo Estado, escondidos em escritórios esquecidos, documentos ensebados e vestiários aquecidos e suados, proliferando a dupla identidade contida nos quereres mais profundos desta vida. Somos esse bando de veados escrachados, inescrupulosamente afetados ou luxuosamente paramentados para dar e para receber.. Somos pobres viciados nas virtudes do prazer! Pois há muito que trocar por todos os lados dos buracos e regaços, que é preciso penetrar para conhecer e desfrutar. Somos os pentelhos desses veados que insistem ousar gozar enquanto uns e outros mais fracos, tolos ou enfeitiçados pela ignorância da sobrevivência, preferem a incoerência de empatar, a violência de reprimir ou a desgraça de estuprar.
Não é sempre gozado de afirmar, mas quer queiram, quer não, somos aqueles meninos, veados do passado, criados como presentes e educados para o futuro por pais e família em casas de muros iguais aos teus, aos meus e aos de todos os outros mortais. São todos muito normais esses pecados, são percalços banais e safados, portanto, humanos demais para que os deuses sensuais recriminem o que de quem quer que seja. Seja de quem e como for, parecemos tão distintamente parecidos em nossas diferenças que somos homossexuais!
Ademais, não foi Cristo que nos ensinou a beijar a face uns dos outros e vermos a beleza do que é próprio de nós mesmos?
Acontece que também somos veados esfolados, como esses típicos veados operários, oprimidos pela mazela e pela miséria do salário, pela mesmice mediocrizante e tantalizante do trabalho, apressadamente aposentados como aidéticos raquíticos em patéticos hospitais sifilíticos, como se a saúde de morféticos e tísicos delicados fosse um grande desperdício para os tímidos dos cofres públicos, que, na verdade, estado blindados, como seus públicos cintos de castidade.
Na privacidade das privadas somos todos úteis, utilizáveis e usuais... Assim, de quatro, virados para os patrões, imobilizados em troncos preparados para as representações dos sádicos ou em sacrifício temperado para as refeições dos ladrões civilizados pelo mercado, somos todos um pouco coitados, escravos aflitos ou profissionais brutalizados por horários e hábitos morais...
Sabemos que somos veados fragilizados e explorados pelos que querem nos foder sem pagar, ou querem pagar o dobro para quem não é como somos e tem menos fantasias do que temos... Mas há de vir o troco, porque somos loucos e revolucionários, sonhadores visionários e incendiários, que queremos ver o circo pegar fogo para que todos os homens livres em direitos tornem-se fraternais com efeito, promovendo orgias e bacanais.
Somos sim esses veados cheios de sacanagem, libertinagem por todos os lados e veadagens por todos os portos, dispostos e ciosos como excitados animais no cio, gatinhos pelados, franguinhos depenados e ursos peludos encoxados, empalados e esprimidos uns nos outros.
Somos esses moleques de recados escusos, veados flagrados em atitudes suspeitas, ocasiões duvidosas, posições esquisitas e situações embaraçosas. Somos todos aqueles que têm cu e não têm medo de levar e de trazer, doa a quem doer...
Mas é preciso não perder de vista que também somos esses veados pervertidos, arrivistas procurados como bandidos e caçados como marginais de ocasião. Nunca é demais lembrar aos seus irmãos, bibas ou outras bichas festivas que, se nessas paradas legais alguns veados sazonais saem de trás do armário, é também nesta terra que o veado se ferra, é protelado e esnobado, quando não, assassinado por fanáticos católicos, stalinistas apavorados, nazistas furtivos e todos os demais cachorros raivosos e acovardados que rondam à esmo com perversões, esquadrões, linchamentos e ameaças.
É duro... Mas aí é que é bom!

*
Fernando Bonassi é roteirista de cinema e TV, dramaturgo e cineasta e escritor de diversas obras.

terça-feira, 8 de setembro de 2009

um corpo vazio.

havia uma lacuna naquele espaço. talvez, fosse culpa da chuva que deixava nossos dias frios. talvez, fosse o espaço vazio que beirava nossos corpos já tão distantes.

Ele sentou no sofá assim que entrara no apartamento. a janela da sala encontrava-se aberta, com o soar de gemidos que a brisa gélida daquela tarde fazia ecoar pelo apartamento. as persianas dançavam, sem compasso ou algo que lhe marcasse ritmo . Ele olhou em volta e viu que tudo estava no mesmo lugar da manhã, dando sinal que Ela não havia chegado em casa ainda. Ele sentiu falta d´Ela.

não tardou e levantou, sentido banheiro, onde tomaria um banho para esquentar a pele que agora era fria. abriu o chuveiro e encostou o corpo na parede do box, que permitia sentir o bater pulsante do coração. podia ouvir as gotas cairem lentamente no chão, o mesmo barulho que ouvira da chuva. ouviu o ranger do elevador.

a porta abriu. Ela entrou. jogou o corpo molhado no sofá e suspirou pelo cansaço do dia de chuva. ouviu o barulho vindo do banheiro. imagino que Ele já estava em casa. suspirou novamente. levantou do sofá, caminhou até o quarto e tirou a roupa molhada. Ele adentrou o quarto e olhou para aquele corpo que tanto admirava. Ela se virou, na tentativa de fugir dos olhos dele. foi até o banheiro e ligou o chuveiro. enquanto a água corria por seu rosto, Ele entra no banheiro:

- o que você tem?
- não tenho nada. quero só tomar um banho quente.
- e não me diz mais oi? e foge do meu olhar?
- me deixe em paz por agora, é a única coisa que te peço.
- olha, eu sei que o que aconteceu ontem causou um estresse entre nós. mas acho que podemos superar isso.
- podemos conversar depois que eu sair do banho, por favor?

Ele sai e fecha a porta atrás de si. Ela agachou no box. sentiu a água, agora, um pouco mais gelada do que antes. olhou para seus dedos que enrugavam sem ela perceber. isso sempre acontecia, desde que era criança, quando brincava com a mangueira no quintal da vó. pegou seu sabonete de camomila e esfregou o corpo com tanta delicadeza que já não lembrava a última vez que fizera aquilo. tantas coisas já estavam passando dessa forma, tão desapercebido, que ela não lembrava de quando fora a última vez que fizera um tanto de outras coisas. aliás, até lembrava, desde que Ele se tornou obsessivo por seus passos e, desde então, sua vida se tornara algo que era fora de seu controle. o tempo já não era seu. os amigos já não eram seus. os dias já não eram mais vividos. ouve o barulho do rádio que Ele ligara na sala. ouve o cd que Ele lhe dera no primeiro dia em que sairam. isso já não lhe traz mais sensação alguma. Ela já não sente por Ele o que ele pensa sentir.

Ela desliga o chuveiro, enrola a toalha no corpo e vai para o quarto, tendo a certeza de trancar a porta dessa vez. tira do armário um moleton e sua camiseta de Harvard que seu irmão lhe mandou. coloca meias coloridas e chinelo. vai para a cozinha.

- Ela, podemos conversar?
- Ele, não sei se estou muito a fim agora. tive um dia cansativo e essa chuva, para ajudar, me ensopou quando sai do trabalho. estou com fome e com sono. deixa essa conversa para outra hora.
- mas Ela, eu queria te pedir desculpas. eu sei que errei. poxa, queria te pedir perdão pelo que fiz ontem. juro que não queria fazer cena mas, te ver tomando café com outra pessoa me deixou furioso.
- Ele, eu estava tomando café. sabe o que é isso? tomando um café!
- agora eu sei. mas sei lá o que burros na água eu imaginei. te peço desculpas de verdade. você sabe que amo você e sei o quanto chamas atenção por onde passa. tenho ciúmes desses caras que não tem respeito por uma mulher casada!
- sabe quantas vezes isso tem acontecido nesses meses? e quantas mais irá acontecer?
- olha querida, eu não posso jurar nada. mas quero tentar. você é a mulher da minha vida e sem você não sou nada. não quero te perder. me desculpa?
- eu já não sei Ele. são tantas possibilidades de que isso pode acontecer... deixei de sair com meus amigos, minha família reclama da minha ausência, você me liga toda hora no trabalho... como posso viver assim?
- querida...
- querida não. eu já não sei se essa relação faz bem para nós. fomos tão felizes... até você surtar com esse ciúme louco. parece que não somos nada mais. sinto que há um vazio tão grande entre nós.
- mas podemos reverter isso. que tal uma nova lua de mel? sei que você logo entrará de férias e...
- não. já não quero nada vindo de você. aliás, até quero. quero paz. quero ter minha liberdade de ir e vir. quero poder rir sem você ficar olhando para os lados, tentando ver se eu estou flertando com alguém. Ele, fomos um corpo só, em algum momento de nossas vidas. mas, hoje, percebo que somos dois seres dividindo um espaço, uma vida, um corpo vazio.
- me deixa tentar, pelo menos!
- não. o que senti por ti foi tão gostoso. vivemos dias tão profundos, que me perdia naquela sensação que me deixa fora de mim. mas isso passou... não há mais nada aqui!
- me deixa tentar! pelos dias que fomos felizes. pelo que construimos juntos. por tudo o que fiz por ti.
- já basta. isso foi o fim. chega de discussões, de promessas quebradas, de vizinhos vindo ver se está tudo bem. cansei dessa vida... nosso casamento chegou ao fim.
- não...

Ela sai da cozinha e vai para o quarto. abre sua mala e coloca todas as suas roupas, seus cds, livros. apanha um casaco que estava na beirada da cadeira da escrivaninha. vai para a sala e pega tudo o que era seu que estava naquele lugar.

- Ela, onde você vai?
- estou indo para a casa da minha mãe. pode ficar com as coisas do apartamento. que você seja feliz.
- você está indo embora? você não pode ir embora e me deixar aqui!
- eu vou e ponto. vou fazer algo que deveria ter feito a muito tempo, deixar você sozinho com sua loucura.

Ela apanha o gato que estava no canto da sala. arrasta sua mala até o hall e aperta o botão do elevador. Ele está na porta, de cuecas, com o olhar mais sem brilho que já vira. o elevador chega e Ela entra com sua mala e o gato. vê, pela fresta do elevador, a última imagem envelhecida daquele homem, por quem, um dia, teve amor.

- Ele, agora eu vou viver.

Ela sai do prédio e sente os primeiros pingos frescos que não sentira à tanto tempo. na verdade, e somente depois ela perceberia isso, que o que ela sentira, foi a sensação de liberdade de sua vida.

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

perturbação.

"numa noite...o meu sonho aproximou-se do meu ouvido e sussurrou palavras perturbadoras"...

me disse que o céu não é azul. que a vida não é um filme. que as pessoas nem sempre são felizes no final. que o mar não é tão infinito quanto eu imaginava. que o beijo não é sempre doce. que o abraço nem sempre é amigo. que a vida passa e a gente nem percebe que o tempo está correndo. que deus nem sempre é bom e, que às vezes, ele nem sempre está onipresente para me ajudar.

comentou que já viu pessoas chorarem por amor, por dor, por solidão. que já viu os cabelos brancos de muitas pessoas crescerem para morrer. que os dias podem ser secos no verão. que as matas estão sendo queimadas para dar lugar a plantação. que os humanos manifestão suas vontades por meio de queimadas. (e cadê o meio ambiente nisso tudo? como o nome já diz, é meio mesmo. daqui a pouco, é extinto ambiente).

mostrou que nada mais é criado. hoje em dia, tudo se limita ao control+c e control+v. que os padres não dão mais só bênçãos e que os pais tratam seus filhos como se fossem amantes.. que o medo virou calamidade e que as pessoas preferem ficar em casa, com medo de bala perdida. que se alguém te parar na rua, é quase certo que será um assalto.

riu quando viu nosso senado. tantos homens barbados, falando mentiras, desviando dinheiro do povo para dar luxo a família. que as construções públicas demoram mais tempo do que 87 vezes a construção do mundo, que fora em 7 dias (?!). que as areias para levantar os prédios são areias da praia. que os "homens enviados por deus" estão cobrando as entradas do céu.

o meu sonho me perturbou durante uma noite. durante as outras seguintes, eu não consegui dormir.

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

.estilo Jece Valadão.

no dia em que ele adentrou o expediente, e ela o vira pela primeira vez, sentiu seu corpo tremer por aquele outro corpo de um tom de pele moreno claro, olhos verdes, sorriso gracioso e jeito "Jece Valadão" de ser. usava sapatos pretos, calça azul marinho e uma camisa branca, de manda curta, com os três primeiros botões abertos, deixando a penugem do peito florar para fora daquela camisa. no instante que vira aquele corpo, sabia que teria de ter um pedaço, instante ou prazer dele.

os dias eram longos. eles tinham o mesmo horário de trabalho. vez por outra, se encontravam na escada e sorriam com um sorriso gosto de hortelã. ele vinha de casa, deixando a esposa no trabalho e a filha na escola. ela vinha de sua casa, onde morava com um amigo gay desde que veio para são paulo.

a convivência abalava seus pensamentos e tirava sua completa concentração. ele passava, sorria e deixava um perfume no ar, um odor másculo, que mexia com seus hormônios e sentidos. sabia que aquele homem seria seu pecado.

uma tarde, ela tomou coragem e o convidou para ir à um bar. a situação entre os dois, ali sozinhos, num final de sexta-feira, era quase insustentável. as mãos, quando se tocavam, mesmo que sem querer, causa um tremor e um baixar de olhos que denunciava a intenção presente. o bar não se estendeu muito e a decisão de procurarem um lugar mais discreto foi quase instantânea e sussurrada.

o primeiro letreiro vermelho foi o decidido. na verdade, não havia algo para ser decidido, somente feito. no instante em que a porta foi fechada, as roupas saltaram dos corpos no segundo em que deitaram na cama, quase sem perceber. a pele de tom moreno claro dele se fundiam com a cor morena jambo de sua pele. foram descobertas, olhares, beijos, línguas que iam e vinham, as bocas que eram preenchidas por pêlos e músculos, as mãos que adentravam espaços escondidos e o contato mais íntimo, mais profundo daquela noite. depois de algumas horas, cada qual foi para seu lugar.

o dia seguinte foi o mais complexo. a dúvida se inquietava nela por querer mais daquele prazer concedido. os olhares eram desviados por trazer a lembrança e as sensações ganhas na noite anterior. ela achou que não agüentaria e, como mais uma de tantas que ele deve ter, teria sido somente isso e pronto. no fundo, ela só queria mais uma noite de sexo, e isso lhe contentaria. achava até bom. seria uma troca justa. sexo por sexo. e por quê não?

por uma mensagem no celular, ela percebeu que teria o que queria. e não somente mais uma vez, aquela cena se estendera por dias, semanas, meses... mas deixava de ser somente sexo, havia algo emanando deles que não conferia somente sexo, eram gestos de carinho, preocupação, companheirismo...

numa manhã, quando sua mulher estava saindo do carro, ela o olhou e disse:

- eu tenho nojo de você.
- o que aconteceu?
- você agora chega em casa com cheiro de outro sabonete. com um cheiro de perfume na camisa que não é meu. você chega tarde, não diz mais nada. você anda recebendo mensagens no celular de outra mulher. eu sei, eu vi, não tenta mentir.

ele abaixa a cabeça. não diz nada.

quando chega ao trabalho, ele não a encontra durante o dia. volta para casa, pega suas coisas e sai sem dizer nada. vai até a casa dela, toca a campainha e é recebido com olhar de surpresa. adentra a sala, senta numa cadeira e segura o rosto com as mãos. conta o que aconteceu e diz a ela que não sabe o que fazer, não tem onde dormir aquela noite e tudo está muito confuso. ela diz que, por hoje, ele pode dormir lá, mas depois, terão de ver o que fazer. ele olha para ela e diz que ela o fez mudar, que quer crescer com ela, que ela é tão diferente das outras mulheres com quem ele ficou. diz coisas para ela que vislumbra para o futuro dos dois.

ela olha para ele, sorri um sorriso amargo e balbucia coisas que ele não ouve.

- os planos não eram esses. eu gosto de você e sei que acabamos nos envolvendo um pouco mais... mas não me vejo morando com você, sabendo que você não é homem de uma mulher só e que sou possessiva. ambos queríamos sexo e tivemos e foi bom, muito bom. mas é só isso. eu não posso dispor algo que não tenho agora. e não quero. meus planos não eram esses.
- mas o que faço agora? depois que conheci você, quis mudar, melhorar, progredir. eu gosto de você e quero morar contigo.
- você não pode fazer de minha vida sua base. você precisa se fortalecer sozinho. eu posso te ajudar agora, mas será só isso. podemos procurar um lugar para você dormir enquanto não aluga sua casa. mas você irá sozinho.

ele não acredita no que ouve. acabara de perder tudo o que tinha: casa, esposa, filho e amante. o que mais poderia perder.

sem poder raciocinar direito, ele levanta e vai para rua, sem rumo nem mundo.

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Léia, a mulher perfeita.

Léia era uma moça que se enquadraria no modelo de mulher perfeita: filha, irmã, esposa, amiga e professora dedicada à todos. Gostava de elogios sobre sua doçura e simpatia. Era a pessoa daquelas que se gosta só de olhar.
Era irmã de duas mulheres e um homem. Era tia de algumas sobrinhas. Na escola, era a tia dos bebês. Com eles, seu linguajar mudava: parecia criança falando e se esquecia de que, fora de lá, ela deveria se portar de outra maneira.
Léia tinha um jeitinho que ninguém nunca dizia não. Ela tinha o olhar, o sorriso e a cabecinha de lado que derreteria qualquer coração de gelo, por mais frio que fosse. Era do tipo mãezona: cuidava de todos, se preocupava com cada detalhe, mesmo que desnecessariamente, ela acalorava todos com sua doce atenção e nunca recebia um não para nada.
Pele morena, corpo que despertava a atenção de todos os homens. Passava sempre acanhada mas, no fundo, gostava que eles assobiassem para ela. Mexia com seu ego, com sua vaidade. Seus cabelos tinham as pontas enroladas, mas ficavam em perfeita arrumação com o balançar do vento.
Era casada com o único homem que beijou, namorou e transou. Casaram segundo manda o figurino: igreja, véu e lágrimas. Foram morar juntos em uma casa simples, com quintal e um pequeno jardim, onde foram avisados sobre a presença de ratos naquela região. Mas o que Léia queria era a casa dela.
Quando o marido a procurava durante a noite, ela resmungava, dizia que estava cansada e que tinha dor de cabeça. O sexo, para ela, tinha de ter as preliminares. Preliminares constituídas de: passeio, jantar fora e filme na cama, só assim, ela daria para ele. Se não o fosse, não daria o que ele tanto queria. E ela reclamava para as amigas e dizia que, quando ele não a procurava, ficava feliz. O que ela queria mesmo, era alguém para encostar a noite e dormir abraçadinho. Se não tivesse o sexo, melhor.

O tempo passou. O filho não veio. A casa nova não veio. Coisas novas não vieram. Quase tudo continuava igual. Uma coisa mudou: o marido. Ele havia arranjado uma amante. Uma mulher fogosa, que topava tudo e a qualquer hora. Ele não precisava bajular para conquistar.
Léia percebeu a mudança do marido, percebeu que as roupas dele mudaram. Percebeu que o encontro com os amigos não era mais só aos sábados para o futebol, mas havia se estendido para o pós-futebol ou happy hour de sexta-feira.
- Benzinho, tem alguma coisa acontecendo que você queira me falar?
- O quê Léia? Pirou?
- Sei lá. Sinto que existe alguma coisa entre nós. Alguma coisa que está nos distanciando.
- Não, não há nada. Você deve estar cansada e fica ai, imaginando coisas, essas coisas de novela.

Mas ela não sossegava. Resolveu investigar. Começou a cheirar suas roupas, mexer no seu celular, procurar vestígios no carro. Achou uma calcinha. Uma que não era sua.
- Amor, o que é isso?
- O quê Léia?
- Essa calcinha. De quem é essa calcinha?
- Não sei. Onde você a conseguiu?
- Não mente, benzinho. Achei essa calcinha no seu carro. Quem é ela?
- ...
- Quem é ela, benzinho? Por quê você tem uma amante?
- Sabe Léia, tenho pensado sobre nós... Acho que nosso casamento não tem mais jeito. Temos vivido de aparências. Chegamos num ponto onde cada um deve seguir sua vida sozinho. Amanhã vou arrumar minhas coisas e saio de casa. - Como? E para onde você vai? E como eu fico?
- Não sei. Na verdade, não quero mais saber. Sei que você poderá fazer outro homem feliz.
- ...
- Durmo hoje aqui ainda e depois, sigo meu rumo.

Ela não poderia sustentar uma separação. Como o único homem que ela conhecia poderia fazer isso com ela? O homem por quem ela dedicara tanto de seu amor, agora a deixava só. Estava a trocando por uma aventurazinha, uma outra mulher que já deve conhecer a cama de tantos homens quanto às areias da praia. Ele estava a deixando. Ele...
Preparou o jantar. O chamou e disse que compreendia o que estava acontecendo e queria que eles fizessem uma última ceia juntos. Ele sorriu e imaginou que ela havia entendido e que sentia o mesmo pesar pelo casamento deles. Sentou-se na mesa, ela o serviu com um strogonoff de molho branco com arroz e salada. Ele adorava aquele prato. Comeu até dizer chega e agradeceu a compreensão dela.
Foi para o quarto, abriu a mala de viagem e começou a tirar as roupas do armário. Sentiu uma leve tontura e sentou-se na cama. Seu corpo começou a se contrair, enquanto sentia seu coração bater cada vez mais lentamente, cada vez mais lentamente. Sua boca secou, sua mão estava paralisada. A única coisa que viu foi a figura de Léia no quarto, segurando o vidrinho de chumbinho que havia comprado para dar fim nos ratos. E ela acabara de dar fim num rato.

Léia não poderia ser abandonada por alguém à quem dedicara tanto de sua atenção.

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

personalidade.

O que constitui a personalidade do individuo?

Acredito que a personalidade não é algo que desenvolve com o individuo, mas se manifesta como estados de espírito, em momentos determinados. Se estivermos felizes é resultado do momento vivido. Ninguém nasce feliz ou não, mas permanece nessa situação decorrente de um fato que lhe traz graça.

Nenhum ser é algo, mas permanece. Ser é determinista por excesso. Mas, quando deixando os fatos na instância de momentaneidade, possibilitamos a vulnerabilidade do ser, convivendo com a não expectativa das coisas, que é o conceito de esperar pelo outro. As pessoas acostumaram a viver com os braços erguidos esperando por um ser que nunca viram, mas insistem em suas crença, realizando ações e dando júbilos à outro.

Não existe um ser que seja algo. Os românticos estão em estado de romance, o que é algo temporário. Talvez, Vinícius de Moraes tenha sido um dos poucos que estiveram nesse estado durante muito tempo. Suposto que, em outros estados, estava solteiro ou ainda à procura de um novo amor (casou 9 vezes e teve 5 filhos). Imagino que Vinícius tenha sido um poeta em tempo completo, estava sempre em estado de paixão.

Indagar sobre o que somos seria impor meu pequeno autoritarismo. A personalidade dessa pessoa que aqui vos fala, és preenchida por diversas instâncias de momentos. E, incrivelmente, constantemente, com um sorriso estampado na face.

Vivo meu estado de graça.

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

verbo conjugado de dar.

Eu te dei.
Dei-te todas às vezes que quis. Quando pensava em teu corpo, lá estava. E assim eu o tinha.
Dei-te durante as horas que seguiam noite. Emaranhávamos os corpos à mercê de limites.
Dei-te o tempo, o desejo, o suor, o meu prazer. Era a realização do meu desejo. Nada mais.
Dei-te enquanto teu corpo rendia libido. No dia que você virou comum, dei-lhe adeus.
Dei-te por minha satisfação e ego.

Eu te dou.
Dou-te o abraço, o beijo desejoso por outros beijos. Viva boca que chama meus sentidos.
Dou-te as ancas, as entranhas. Tiras minha segunda pele e arranque gemidos tolos e roucos.
Dou-te todas às vezes que quereres. Será meu corpo em teu corpo. O teu prazer em meu prazer.
Dou-te quando ninguém perceber. Entre sua nuca e seu pé, minha saliva fecha seus poros.
Dou-te por minha paixão e afeto.

Eu te darei.
Dar-te-ei um dia, quando menos esperar. No dia em que me ligares e convencer-me de que pode fazer muito mais.
Dar-te-ei quando o dia se fizer por noite e quando a noite fizer por dia. No véu negro das horas, irei clarear teus instintos.
Dar-te-ei os sentidos, a luxúria, as perversidades dessa máquina desejante, os segredos de uma libertina.
Dar-te-ei as palavras sacanas, ditas ao pé do ouvido, somente em sigilo. E junto com as palavras, virão gestos e olhos que não terão mais foco.
Dar-te-ei por minha única vaidade.

Dei-te, dou-te e dar-te-ei algo para meu, e somente meu.

domingo, 9 de agosto de 2009

.sem clichês.

nunca fora de muitas demonstrações públicas de afeto. preferia sempre coisas práticas, sem clichês.

apaixonara uma vez, sem sucesso. e achava que, passada essa vez, já era o suficiente. voltara todo sua atenção para sua carreira. começou a planejar dez anos à frente. sempre só.

teve paixões sim. mas sempre tão passageiras, que nem saudades conseguia sentir. pensava em como as pessoas entendiam o amor: seria uma forma de insanidade, esquizofrênia ou alucinação que não poderia ser diagnosticado?

de uma em uma, acabou colecionando telefones e egos sobre sua intimidade. passava noites com diferentes pessoas, com diferentes sensações. mas não sentia nada daquilo que os poetas diziam sobre o amor.

chegara a pensar que não lhe seria possível esse 'amor' tão lido, tão cantando e tão evocada nos sonhos das pessoas. o amor não lhe passara de uma grande útopia tola.

vivia de pequenas emoções concedidas por pessoas que lhe sentiam afeto. achava que as pessoas tinha algum interesse físico no outro, e assim adentrava em novos acasos que, particularmente, tinha vida tão curta quando água em deserto.

sem esperar, sem querer, sem saber, acabara se apaixonando novamente. encontrava-se rendida à toda sentimentalidade que vinicius escrevia em seus poemas sobre amores extremos.

percebido isso, pegou o telefone e disse:

- esse sentimentalismo todo me faz chorar.

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

poema da última madrugada.

Os meus poemas são assim:
Não cresce pelo começo,
Desenrola-se com o fim.
O pé da história é o primeiro
A desabrochar,
Fazendo o corpo transparecer e
A cabeça ser a última a brotar.
Falam sobre medos, coragens;
Amores, desamores;
Em prosa e conto.
Nascem personagens,
Gente com história de vida,
Desde a gestação.

Os meus poemas são assim:
Surgem no meio da madrugada,
No metrô, andando na rua,
No olhar perdido da chuva.
Não vou atrás. Pareceria-me
Desesperador ou desiludida demais
Sair gritando por meio mundo:
“Cadê minhas palavras?”
Elas sabem onde moro,
Sabe como me encontrar.
Prefiro que seja assim:
Que elas venham a minha pessoa.

Que puxa poema do início do pé
Até o desenrolar das caraminholas
Dos fios enrolados de uma cabeça pensante.

sábado, 25 de julho de 2009

.jantar.


-um dia, você terá de me recompensar essas contas do bar.

ao ouvir isso, Ela se espanta. como poderia retribuir as contas pagas de tantas idas aos bares? olhou para Ele e disse:

-pensarei como fazer.

Ela passou dias pensando em diversas formas. em coisas originais e únicas. esperou tanto por aquele momento, pensou tantas vezes nele e, agora, estava estarrecida com aquela indagação. resolveu o que fazer para recompensar, algo que fosse de tal altura, que poderia ser um novo passo para o relacionamento deles. mandou uma mensagem no celular: - "já sei como recompensar". e recebeu resposta: -"conseguiu me deixar curioso".

no dia seguinte, se encontraram em um cinema e Ela disse:

-"pensei em algo muito legal. mas preciso do seu apartamento. prometo não mexer em nada. preciso da sala e da cozinha. que tal?"

Ele parou, olhou e disse:

- "tudo bem. mas no que você pensou?"

- "como você bem sabe, nunca cozinhei para alguém. na verdade, não sou muito fã de cozinhar e pouca coisa sei. mas queria cozinhar pra você".

depois disso, foram dias para que Ela não pensasse em outra coisa que não o jantar. causou uma comoção no trabalho, onde conseguiu pratos e jogo americano de bambu emprestado. pegou os talheres de prata de sua mãe. comprou duas taças para o vinho que comprara. comprou velas. imprimiu filipetas de "que não seja imortal, posto que é chama. mas que seja infitino enquanto dure", para decorar a casa. comprou margaridas para usar as pétalas. comprou o capeletti à bolonhesa. conseguiu emprestado um cd da Billie Holiday para ser trilha do jantar e o filme "Pequena Miss Sunshine" para finalizar a noite.

na semana do jantar, Ele foi viajar. voltaria na manhã do dia combinado para o jantar. Ela ligou às 13h:

-"oi. liguei pra confirmar sua chegada. está tudo combinado então para o jantar?"

- "sim, está. vou deixar a chave com o porteiro do prédio. vou sair daqui às 16h."

- "perfeito. devo chegar aí lá pelas 17h. não se esqueça que você deve chegar às 20h. às 20h abrirei a porta do apartamento. nem um minuto a mais nem um minuto a menos."

- "certo. nos vemos mais tarde. beijos".

Ela estremecia. aquele poderia ser o grande dia, o mais esperado por ela desde que o conheceu. saiu do trabalho mais cedo, com mil desejos de boa sorte. quando chegou em casa, tomou banho e pegou tudo o que poderia lembrar, torcendo para não esquecer nada. no caminho até o apartamento de Ele, Ela se lembrou de comprar guardanapos e um saca-rolhas. olhava para todos os lados, para garantir que Ele não estivesse olhando de algum lugar.

entrou no prédio, olhou para o porteiro e disse:

-" Ele me deixou a chave do apartamento 58."

-"sim senhora."

pegou a chave e entrou no elevador. com as sacolas na mão, se sentia em casa. parecia que aquilo poderia ser um préfacio de sua história de amor com Ele. sentia como se aquilo fosse de seu cotidiano, a ponto de querer viver aquilo por mais minutos.

olhou para a porta do apartamento e colocou a chave na fechadura. abriu a porta e viu o apartamento em silêncio. entrou, fechou a porta e acendeu a luz. o gato surge do quarto e Ela acaricia o felino por quem tanto se apaixonara. sentou no sofá e olhou para todos os detalhes daquele apartamento. sentiu todos os cheiros que dele emanavam. sorriu por estar ali só, no espaço de Ele.

foi para a cozinha e colocou as coisas em seus lugares. saiu do apartamento e caminhou até uma confeitaria próxima, para comprar uma sobremesa. conversando com a atendente sobre o que combinaria melhor com capeletti e vinho, escolheu tortinhas de morango, algo que não fosse tão doce.

voltou para o apartamento e arregaçou as mangas. colocou para lhe fazer companhia um cd de Janis. tinha menos de 2 horas para deixar tudo pronto. colocou a mesa de vidro no centro da sala, onde colocou os descansos de pratos, os talheres e as taças. no centro da mesa, Ela arrumou um vaso com uma rosa e dois potinhos onde colocou as velas cortadas ao meio. o restante das velas, Ela cortou da mesma forma e espetou em palitos, que fixaram nos tacos do chão do apartamento. deixou três tocos de velas no quarto. espalhou em locais discretos as filipetas, a fim de que Ele visse dias depois, em momento de distração. colocou um punhado de pétalas em cada arranjo de velas espalhada no apartamento.

terminou a decoração, tomou banho e se arrumou com todo detalhe. seu celular toca e um amigo deseja sorte. ela fica feliz. de fato, seu momento havia irradiado alegrias aos seus amigos.

vai à cozinha e coloca o capeletti no fogo. verifica se o vinho está em boa temperatura. olha as horas no celular, 19h50. esses seriam os 10 minutos mais ansiosos. conferiu toda a casa, todos os aperitivos, conferiu a si mesma.

quando abriu a porta do apartamento às 20h, Ele não estava lá. Ela ficou com cara de boba, tentando entender aquilo. como ele poderia atrasar? faria de propósito? fechou a porta do apartamento e foi à cozinha verificar o capeletti. quando voltou para a sala, abaixou e verificou uma sombra no vão da porta, se lembrara de que seu celular estava 5 minutos adiantado! Ele entra e lhe dá um beijo. Ela vai para a cozinha e Ele acompanha, abre a geladeira para apanhar a garrafa de água mineral do gato. Ele anda pela casa e entre conversas sobre a viagem e beijos, eles vão para a mesa. Ela entra com os pratos de capeletti à bolonhesa, traz o vinho e coloca o cd de Billie. Ele olha e sorri. elogia tudo, em cada detalhe. diz sobre o cd, sobre o filme, sobre as velas, sobre algumas filipetas que já havia achado. Ela explica sobre o "bem me quer e mal me quer" das margaridas. Ele diz que valeu a pena pagar as contas dos bares.

depois do jantar, depois da sobremesa, depois do filme, foram dormir juntos. Ela não saberia que essa seria a última vez que faria amor com Ele.

uma semana após o jantar, Ele passa por conflitos de um relacionamento passado.

duas semanas depois, Ele termina com Ela, no café onde haviam se reencontrado.


depois disso, Ela nunca mais conseguiu vêr o filme que assistiu com Ele e chora toda vez que ouve o cd de Billie Holiday.

quarta-feira, 22 de julho de 2009

.notivoga.

As horas passavam em seu relógio, sem que o sono desse sinal. Desligou o computador, tomou banho e deitou-se na cama. Ligou a televisão na tentativa de achar algo tão chato, que a fizesse logo ficar sonolenta. Tentativa em vão. Acabou achando um filme sobre um traficante que assistiu inteiro. Tinha esse vício pelas coisas, gostava de assistir até o fim. O mesmo vício que tinha com os livros, mas abrir o livro que estava lendo agora seria unir noite com dia.
Andou pela casa, enquanto os outros dormiam. Tentou ficar bem, sozinha, na noite fria, sem importunar ninguém. Quando sua mãe abriu os olhos por segundos e perguntou que horas eram, mentiu dizendo que seria 00h30am. Sempre mentia sobre o horário. Certamente, se disse que já passava das 03h30am, sua mãe logo iria questionar sobre aquela ausência de sono e começar o discurso de que “desse mal não sofro”.
Foi até a cozinha, abriu a geladeira tentando imaginar que, se comesse algo, talvez a fizesse aquietar. Mas foi besteira, não conseguiria comer àquela hora da madrugada.
Já havia pensado em providenciar um emprego que fosse durante a madrugada. Poderia, assim, unir o útil ao agradável. Seu tempo não passaria em vão e poderia aperfeiçoar com um adicional noturno. Mas isso acabaria com as atividades da faculdade ou sua vida social, que já não era mais aquelas coisas, poderia ficar pior.
Queria ligar para algum amigo, papear sobre coisas tolas, para passar o tempo. Mas àquela hora, quem atenderia ao telefone? Nem o melhor dos amantes o faria.
O gato dormia no canto da sala. Pensou em acordá-lo e brincar com o bichano, mas seria egoísta demais e já conhecia seu gato tão bem, a ponto de saber que, se acordado, ele ficaria intocável e inquieto. Decidiu deixar o bichano pra lá.
Olhou pela janela do apartamento, a cidade estava calma. Havia o escurecer noturno do céu que dava margem a um brilho maior das estrelas. Porque as estrelas só aparecem à noite? Achava aquilo um desperdício, sendo poucos os que aproveitam essa imagem.
Já não sabia o que fazer para o sono tomar conta de seus pensamentos. Tentou de tudo: meditou, fez ioga, cantou mantras, tomou outro banho, preparou um chá de ‘boa noite’,..., fez o que podia lembrar para combater a insônia.
E nada... Suas tentativas não tiveram sucesso.

Lembrou do remédio que ganhou de um amigo, dizendo que ‘aquele era confiável. Dormiria “como um anjo”’. Tomou o comprimido de Diazepan e deitou na cama.

Viu cores em seu quarto, sentiu as pálpebras pesarem e apagou.

segunda-feira, 20 de julho de 2009

o Brasil, que samba é...

A classe dominante brasileira tem uma posição muito confortável. Ela pode reclamar que é explorada quando olha para os EUA, e se comportar como exploradora quando olha para os índios, negros e camponeses. É o melhor de dois mundos. Você consegue explorar o explorado e fingir que é explorado diante do explorador, e no intervalo vai passar as férias em Paris.
Outra questão é a própria idéia de desenvolvimento. A humanindade não pode mais crescer. Sou a favor do crescimento zero, de caminhar para uma redistribuição em escala planetária da riqueza. Frases como "continuem consumindo" e "comprem mais carros" são criminosas do ponto de vista da espécie. Nesse sentido, a palavra desenvolvimento é péssima, e a palavra crescimento pior ainda. Nem todo desenvolvimento envolve crescimento econômico; o PIB não mede porcaria nenhuma. O Butão criou um índice de felicidade interna bruta (FIB). Parece piada, mas talvez não seja completamente idiota. Os EUA, que tem um PIB bem maior que o do Brasil, não creio que teriam um índice de felicidade interna bruta maior que o nosso. Não parecem um povo particularmente pacífico, alegre, saudável. Ao contrário: toda semana alguém mata quarenta escolares em algum lugar do país e a obesidade é galopante. Nada que nos faça mirar nos EUA como exemplo da civilização. O Brasil precisa se desenvolver: aumentar o senso de equidade, de justiça, aprender o que é prioritário.

palavras do antropólogo Eduardo Viveiros de Castro.

domingo, 12 de julho de 2009

.telefone.

já perdera a noção de quantas vezes havia tirado aquele gancho do telefone e discado os primeiros números... eram números conhecidos de anos, que nunca conseguiu esquecer. por vezes, sem querer mesmo, discava aqueles números e só depois do primeiro toque, se dava conta de que estava equivocada.
pousou o telefone na mesa novamente. acendeu um cigarro e começou a andar pelo apartamento. de um lado para o outro, deixando o tapete fora de lugar, enquanto deixava seus pensamentos correrem sobre aquela ligação. "alô, oi, sou eu. liguei pra saber como você está. é que sonhei contigo ontem a noite e dizem que quando você sonha com alguém, é sinal de que a pessoa está querendo falar contigo...". putz, se eu disser isso, vou ouvir uma risada amarga. melhor não. melhor não dizer nada. e se eu ligar e só ouvir a voz? ou se colocar uma música de fundo, aquela música que logo irá sacar que sou eu, mas sem dizer que sou eu? mas e se tiver bina no telefone? logo vai saber que sou eu...

o medo poderia ser maior do que a saudade de escutar aquela voz. tinha receio de receber chacóta ou apenas educação, sem alegria alguma. pensou em mandar um e-mail, mas sabia que demoraria para ser respondido e que seria tão ríspido, que nem arriscava. pensou em comprar um cd´s no aniversário e deixar na portaria do prédio, mas imaginou que não receberia nem um telefonema de agradecimento pela lembrança. acabou resolvendo não mandar nada. apenas lembrou da data.

sentou no sofá, com o telefone na mão. acendeu outro cigarro, tentando manter a tranquilidade e torcendo para a voz não lhe falhar naquele momento. pensou sobre a ligação. mas e se eu ligar e não tiver nada mais do que "estou bem obrigada e espero que você também. tchau." certamente morreria de vergonha. mas vergonha consigo mesma, por ter ligado e recebido isso. ficou imaginando o mal estar que seria caso encontrasse na rua. seria aquele sorriso sem graça, que tem gosto de coisa morna, e cabeça baixa, com os pés acelerados, a fim de não ter uma conversa. essa imagem fez pensar nas vezes que se encontraram sem querer. quando os rostos foram virados para não se entreolharem. até quando seria assim? e por quê seria assim? haveria um contrato social pré-concebido dizendo que ex-amantes não devem se falar mais? que devem evitar qualquer contato visual? ficou pensando nisso enquanto o gato brincava com as pontas do tapete levantado. olhou para o gato e viu a mandala desenhada em suas costas. o felino lhe era a melhor companhia para aquela dúvida.

depois de três lambidas do gato, pensou em por quê ligar. quis lembrar quando foi a última conversa e sobre o que prosearam. nesse instante, onde quase perdeu a sanidade, pensou em qual o motivo maior desse seu passo. ou por quê esse passo deveria ser seu. hesitou. respirou. acendeu outro cigarro. pegou o telefone e discou... "alô, Malu? sou eu! tô meio de bode aqui em casa e queria sair um pouco. bora?". se levantou e foi se arrumar para sair.

resolveu que ligar seria rebaixar o orgulho que, por mais desumano que seja esse sentimento, ele acabara de lhe tornar mais humana...

resolveu mandar para o inferno aquele número, juntamente com quem diria alô.

* Mulher ao telefone II - Marcos Leal.

sexta-feira, 3 de julho de 2009

.mulheres no planeta.

Acontece até 11 de julho, no espaço da OCA, no parque do Ibirapuera, a exposição "Mulheres do Planeta".Realizado pelo do artista francês Titouan Lamazou que, durante sete anos, viajou por 40 países fotografando,entrevistando, pintando e ouvindo sobre a vida de mais de 200 mulheres, que resultou na exposição.Futuramente será lançado um dvd e um livro contando as histórias de vida dessas mulheres.

OCA -Av. Pedro Álvares Cabral, s/ nº, portão 3, parque Ibirapuera, região sul, São Paulo, SP. Tel.: 0/xx/11/5572 - 0985. Até 11/7. Ter. a dom.: 10h às 20h. Ingr.: R$ 11 (estudantes pagam meia). Classificação etária: livre

sábado, 27 de junho de 2009

. instintos.

já ouvimos por certo que, o amor, é o caminho da racionalidade emocional (se é que emoção possui razão). que o amor tudo supera, que o amor tudo conforta, que o amor tudo recupera. besteira. não acredito nisso. como Vinicius diria: "a vida é a arte do encontro mesmo que exista tanto desencontro". acho que a vida é feita de encontros furtivos, entre pessoas que estão interessadas em paixões e só.

a ideia utópica de amor fica para o passado, os relacionamentos atuais são moldadas à base da atração física, onde o desejo prevalece na perseverança de se manter afeto com o outro. mas o afeto seria baseado no desejo carnal, logo, os relacionamentos são duradouros enquanto houver desejo carnal.

meus casos e acasos costumam durar três meses, o que é bem válido, sendo essa o tempo médio de duração de minhas paixões. é o tempo de apaixonar, fantasiar mil coisas, passar noitesdiastardes de tesão à flor da pele. se passar disso, vira teimosia ou ... enfim, me apaixono por pessoas com personalidades, aparência ou ideias diferentes, mas o resultado das paixões é o mesmo: três meses. muitas coisas acontecem em três meses e minhas paixões vivem assim, com suas intensidades extremas, felicidades completas e alegrias constantes. mas isso me cansa. chega determinado momento que quero dar um basta nisso e seguir em frente... walking...

me apego e desapego muito fácil. tenho paixões de trinta minutos à três meses, isso é o tempo que elas duram. gosto muito mais daquelas rápidas, onde nada se perde, mas muito se ganha. pequenas paixões me divertem, como aconselha uma amiga. sou feita assim, ou estarei assim até que algo me acometa de uma forma avassaladora e desperte mais que desejo.

ps: obra de Michelangelo - "Paraíso".

sexta-feira, 19 de junho de 2009

.côco de pagu.



Pagu tem os olhos moles uns olhos de fazer doer. Bate-côco quando passa. Coração pega a bater. Eh Pagu eh! Dói porque é bom de fazer doer. Passa e me puxa com os olhos provocantissimamente. Mexe-mexe bamboleia pra mexer com toda a gente. Eli Pagu eh! Dói porque é bom de fazer doer. Toda a gente fica olhando o seu corpinho de vai-e-vem umbilical e molengo de não-sei-o-que-é-que-tem. Eh Pagu eh! Dói porque é bom de fazer doer. Quero porque te quero Nas formas do bem-querer. Querzinho de ficar junto que é bom de fazer doer. Eh Pagu eh! Dói porque é bom de fazer doer.

Raul Bopp

segunda-feira, 15 de junho de 2009

tenho gosto.

tenho gosto por nossos instantes de arte libidinosa,
onde a brasa do cigarro aceso é a única provedora de claridade
na escuridão do quarto, na imensidão da madrugada.

tenho gosto pelas conversas aleatórias, sem começo ou meio,
mas que termina com um riso, que estalo de seus lábios,
que se mostram em meus olhos, com vontade dos meus.

tenho gosto pelo teu cabelo, que se desmancham com o vento,
sem prudência alguma de se alinhar.
tenho gosto pelos seus dedos, que queimam meu corpo feito fogo,
quando a luxúria se faz em conjuntura corporal.

tenho gosto de esquecer as últimas palavras ditas quando dormimos juntas,
mas tenho maior gosto em ouvir tua voz rouca e falha dizendo "bom dia".

e tenho gosto maior ainda, pelo gosto amargo de seus primeiros beijos,
quando o despertar anuncia mais um dia.

tenho gosto.

p/ Chuck.
14jun09
19h05


segunda-feira, 1 de junho de 2009

.coisa de paulista.

segunda-feira, 8h: sistema de transporte público fora de conexão. filas de metrô. metrô que atrasa. metrô que enche. gente que empurra, que pisa no pé. gente que acordou cedo, já pegou dois ônibus e, agora, de olhos fechados, ronca no metrô. gente que se apoia nos próprios braços, com a cabeça em repouso, tentando não pensar no atraso do dia. e o dia que será longo.
vento gelado, pessoas com pressa, aliás, pessoa sempre com pressa. o dia gira junto com o relógio. ninguém mais vê as horas no sol. que triste.
quando a fome bate e a barriga vira gente grande, é a pressa na fila do restaurante ou do bom prato mesmo.
o chefe grita, o telefone toca, os papéis se acumulam, o suor vai destacando na pele do rosto.

tic tac tic tac tic tac tic tac tic tac

finalmente, 18h. mais um fim de dia. vento gelado: o nariz fica vermelho e ardoroso.
fila no metrô, metrô lotado. será que todo mundo sai de casa nesse horário? ônibus cheio, lento e mau cheiroso.
chego em casa. tiro o sapato, sento no sofá. a bolsa cai no chão. sem força, ergo o corpo e caminho para o banho, na esperança de relaxar o corpo que não é mais meu. e sim, de outrem para quem alugo. deito na cama, desmaio.

06h. toca o despertador. acordo e tudo começa novamente.

***
vejo graça no ritmo paulista. pessoas sempre apressadas, atrasadas e cegas.
esse continho seria o cotidiano de muitas pessoas aqui presentes, nesse tempo e espaço.
***
quero graça aos meus dias.

terça-feira, 26 de maio de 2009

.cabeça que pensa.

cabeça que pensa.
e pensa em que? pensa em emaranhado de ideias e confusões.
cabeça que pensa, não deveria pensar.
deveria ficar inerte, como tantas outras cabeças que não pensam.
cabeça que pensa, deixa para trás passado que não quer pensar;
deixa dias que parecem outra vida, outra história vivida. cabeça que pensa, pensa em tanta coisa, que se perde nessas trilhas de pensamentos que levam do nada a lugar nenhum.
cabeça que pensa, é assim, sem eira nem beira.
vive por ai, com seus dizeres que são sem nexo, sem sentido, sem proveito.
cabeça que pensa, será que pensa? e no que pensa?

.o tempo e a alma.

"Não quero ser o último a comer-te.
Se em tempo não ousei, agora é tarde.
Nem sopra a flama antiga nem beber-te
aplacaria sede que não arde
em minha boca seca de querer-te,
de desejar-te tanto e sem alarde,
fome que não sofria padecer-te
assim pasto de tantos, e eu covarde
a esperar que limpasses toda a gala
que por teu corpo e alma ainda resvala,
e chegasses, intata, renascida,
para travar comigo a luta extrema
que fizesse de toda a nossa vida
um chamejante, universal poema".

Carlos Drummond de Andrade

***

"Agora vou perder-me no serpenteado do Douro e entre as fragas espalhar umas cinzas. De seguida, convidarei os deuses para um repasto com fruta da época. Só então estará completa a catarse."